Em homenagem ao Lollapalooza e ao preço proibitivo dos ingressos, segue um Top 3 Shows de Rock incrivelmente baratos a que fui na época da faculdade. Estávamos vivendo plenamente o Plano Real, e o dólar estava entre R$1,00 e R$1,85. Não existia a inconveniente taxa de conveniência. Éramos felizes e sabíamos.
3) Man or Astroman?
O primeiro show (de 5) do MoAm? a que tive o privilégio de assistir foi em 24/11/1998.
Eram (e provavelmente ainda são) desconhecidos por estas terras. Um dia antes, haviam se apresentado em São Bernardo do Campo. Um dos únicos a noticiar foi o Álvaro Pereira Jr., em sua coluna do Folhateen.
No dia seguinte, ganhou matéria de página inteira na Ilustrada, pela dupla André Barcinski e Lúcio Ribeiro. Coco the Electronic Monkey Wizard, nos tranquilizava na entrevista afirmando que era a banda original que estava em turnê pelo Brasil. Na época, o Man or Astroman? tinha um projeto de clones: uma banda só de meninos e outra só de meninas, treinados para tocar as músicas à perfeição.
Alguns dias antes, no Guia da Folha, uma nota sobre a casa de shows Broadway (que ficava perto do Parque Antarctica e do motel Caribe) anunciava “show de tecno do Man or Astroman“. Como eu disse, eram desconhecidos.
A minha sorte é que era amigo do Milton, um punk de Alphaville que sabia tudo de bandas desconhecidas (entre elas, o Mustard Plug). Ele já havia apresentado à turma os alienígenas que esmerilhavam na surf music espacial. Compra certa!
Pagamos R$20,00 no ingresso e fomos em bando.
Era uma terça-feira e o show foi começar lá pelas 3 da manhã. E que show!
O lendário Birdstuff surrava a bateria em velocidades supersônicas. As guitarras de Star Crunch e Dexter X-man from Planet Q eram dedilhadas ao estilo Dick Dale como se não houvesse amanhã. No centro, Coco the Electronic Monkey Wizard comandava as coreografias da trupe vestida de macacões cor de abóbora, ora com seu baixo poderoso, ora com um teclado de computador de onde tirava as vinhetas de filmes B de ficção científica iguais as dos discos.
Nos sentíamos privilegiados por escutar uma sequência interminável de rock instrumental, incluindo Television Fission (até hoje uma das minhas preferidas – não achei vídeos desse show, mas tendes abaixo um de 2010 pra sentir um gostinho). E o privilégio foi maior quando foram executadas as raras faixas com vocais —as covers Television Man (dos Talking Heads) e Destination Venus (da obscura banda The Rezillos).
O auge de tudo foi quando Coco the Electronic Monkey Wizard ateou fogo na própria cabeça. Literalmente.
Ainda na mesma semana, vi o 2º show deles, dessa vez sozinho, em Piracicaba (!), num bar de skatistas (!!). Não consegui achar registro de quanto paguei, mas deve ter sido na faixa de R$10,00.
O terceiro show foi na 2ª turnê da banda. Na verdade, um pocket show na Saraiva. O preço? Zero reais. Em 05/10/1999, assisti os caras pela 4ª vez, de novo na Broadway, ingressos de R$18,00 a R$22,00. Mas foram apenas umas 3 músicas: algum idiota jogou uma lata de cerveja na cabeça de um dos integrantes e o show foi interrompido.
2) Little Richard
Foi em 17/03/1997 que vi a Rainha do Rock no extinto Olympia, em São Paulo.
Foi também a primeira vez em que fui a um show com lugar marcado e com mesas ao invés de pista. Quem me acompanhou foi o grande amigo Fernando, também fã de rockabilly (se bem que hoje ele esta mais pro lado do samba de raiz).
O show foi curto e minimalista. Nada de cenografia ou firulas. Apenas Little Richard, toneladas de pancake, seu piano e a banda de apoio, durante pouco mais de 30 minutos.
Na época, o Pequeno Ricardo contava com 65 anos e visivelmente não aguentava puxar o ritmo muito além disso.
O pancake derretia e pingava conforme o inventor do rock'n'roll martelava seu piano de forma ensandecida, desfilando hits primordiais como Long Tall Sally e Tutti Frutti. De novo, não achei vídeos do show. Esse aí de baixo, gravado em 1995, é só pra dar uma ideia.
Os berros e falsetes potentes estavam lá, como se estivéssemos em 1950.
O momento antológico aconteceu perto do fim. Os poucos jovens que estavam sentados em frente ao palco ousaram levantar de suas mesas e arriscar uns passos de dança. Os seguranças intervieram imediatamente, questão de ordem. Little Richard interrompe a música, manda os seguranças soltarem os rebeldes e convida-os a subir ao palco. Êxtase! Foi a senha pra plateia vir abaixo, empurrar mesas e cadeiras e começar a dançar numa celebração coletiva ao bom e velho rock'n'roll, enquanto a organização só podia olhar, aturdida.
Eu vi a história acontecendo ali, pela módica quantia de R$30,00 (o ingresso mais barato, longe do palco e na lateral. A título de curiosidade, o ingresso mais caro custavam absurdos R$70,00).
1) AC/DC – Ballbreaker Tour
Já vi alguns shows grandiosos na minha curta vida. Palcos gigantescos com toneladas de parafernália. Plateias enormes. Caixas de som que emanaram decibéis bem acima do recomendado. Rock selvagem, comportado, sublime, pesado, histórico. Mas nenhum superou a primeira vez em que vi o AC/DC no Pacaembu, em 12/10/1996.
Curiosamente, o primeiro contato que tive com Angus e Malcolm Young, Brian Johnson, Cliff Williams e Phil Rudd foi ali, no gramado coberto do Estádio Municipal Paulo Machado de Carvalho. É sério: nunca tinha escutado AC/DC, sequer fazia ideia de que tipo de som eu ouviria.
É o tipo de risco que dava pra correr quando os ingressos custavam entre R$20,00 e R$35,00. Impensável, hoje.
Eu e meu amigo Marquinho (esse já era fã de longa data) chegamos cedo e nos instalamos mais ou menos no meio de campo. Ainda era dia quando o Angra, uma das mais longevas bandas de metal brasileiras e que também eram ilustres desconhecidos para mim, começou a tocar na apresentação de abertura. Foi das coisas mais engraçadas e constrangedoras que presenciei. Absolutamente ninguém deu bola pro Angra. As rodas de truco corriam soltas no tablado.
O sol se pôs. O Angra voltou para o buraco de onde veio. Os telões se acenderam. Beavis & Butt-head aparecem e começam um daqueles diálogos impagáveis. Angus Young invade a área em forma de desenho. A enorme bola de demolição começa a balançar no palco, soltando faíscas. Quando ganha impulso, arrebenta o muro, revelando a banda e os primeiros acordes de Back in Black. Catarse. Fui conquistado ali.
O que se seguiu foram momentos de rock cru, pesado e incrivelmente alto. Angus arrebentando em solos intermináveis e incríveis. Brian Johson berrando seus agudos.
O blues cafajeste The Jack. O turbilhão de Whole Lotta Rosie enquanto uma boneca inflável imensa se contorcia atrás do palco. O riff matador de Ballbreaker. As badaladas poderosas de Hell's Bells, com direito ao sino gigante. Tudo acabou de forma apoteótica com a salva de tiros de canhão para For Those About to Rock.
Todas músicas que ouvia ali pela primeira vez, e todas se tornavam clássicos instantâneos enquanto eram processadas entre meus ouvidos e meu cérebro. Uma música primeva, que falava diretamente às entranhas.
Só faltou Jailbreak, para decepção do Marquinho.
Set list:
- Back in Black
- Shot Down in Flames
- Thunderstruck
- Girls Got Rhythm
- Hard as a Rock
- Shoot to Thrill
- Boogie Man
- Hail Caesar
- Hells Bells
- The Jack
- Ballbreaker
- Rock and Roll Ain't Noise Pollution
- Dirty Deeds Done Dirt Cheap
- You Shook Me All Night Long
- Whole Lotta Rosie
- T.N.T.
- Let There Be Rock
- Highway to Hell
- For Those About to Rock
Entrei sem conhecer picas, saí um fã quase religioso. Vim a conhecer Bon Scott. Hoje, tenho a discografia completa da banda na estante. E, sempre que ouço algum riff dos irmãos Young, relembro com carinho daquela primeira vez.