L.O.A.S. – Orquídea Negra [Edição Definitiva]

Apesar do roteiro de Neil Gaiman… Apesar da bela arte de Dave McKean… Apesar da incrível edição definitiva encadernada da Panini… Apesar dos extras —incluindo roteiros, a proposta original da série, os comentários do autor e de Karen Berger (a über editora que praticamente introduziu o conceito de HQs para o público adulto na América e foi diretamente responsável pela British Invasion na DC Comics, com gente do quilate do próprio Gaiman, Alan Moore e Jamie Delano)…

Apesar de tudo isso, Orquídea Negra —primeiro fruto da longeva parceria entre Gaiman e McKean nos EUA e mais uma semente do então inexistente selo Vertigo— deixa um gosto rançoso ao término da leitura. Ao contrário da maioria das obras em quadrinhos do escritor britânico, Orquídea Negra envelheceu mal.

Dave MacKean e Neil Gaiman
Dave MacKean e Neil Gaiman (o guarda-roupa de época do McKean também envelheceu mal, ao que parece)

A completa reformulação de uma personagem obscura do panteão de combatentes do crime da DC Comics tem lá seus momentos inspirados. Neil Gaiman pega essa heroína do quinto escalão e subverte sua origem, transformando-a num experimento de laboratório: a primeira de uma linhagem de híbridos humano-vegetais. De quebra, subverte as regras do gênero nas histórias em quadrinhos, assassinando a protagonista nas primeiras 10 páginas. O que se segue é a busca de uma segunda (e última?) Orquídea Negra por sua identidade, uma cópia física perfeita da finada super-heroína, que retém “memórias emocionais” de sua antecessora.

Orquídea Negra Edição Definitiva

Entre os tais momentos inspirados, destacam-se principalmente a exploração do conceito de planta consciente, as interações com a galeria de vilões do Asilo Arkham em Gotham City (notavelmente humanizados) e com o Monstro do Pântano de Alan Moore, a estrutura algo noir das investigações da nova Orquídea Negra e de suas interações forçadas com o mundano mundo do crime das ruas, e a crítica à mesquinhez e falta de consciência da humanidade em contraponto à questão existencial do que é ser humano. Não há dúvidas de que Neil Gaiman e Dave McKean se apropriam de uma marca mais do que desgastada e a transformam numa criação original com vida própria.

Orquídea Negra encontra o Monstro do Pântano
Orquídea Negra encontra o Monstro do Pântano

Mas há algo que faz o conjunto destoar e é até difícil de identificar. Seriam os diálogos, que trazem muito do ranço dos anos 80 e, às vezes, parecem datados? Ou o uso de um dos mais famosos vilões da DC como antagonista, que tira o leitor repentinamente de um mundo “único” e “inédito” e reforça o sentimento de estar lendo apenas mais uma revistinha de super-herói —ainda que uma das boas, estranha, cadenciada e longe do convencional?

[É engraçado como as interações da Orquídea Negra em Gotham, incluindo uma participação especial do próprio Batman, não despertam o mesmo sentimento. Talvez, pela característica excessivamente urbana do cenário e dos personagens. Mas basta mencionar o nome do icônico super-vilão para a suspensão da descrença vir abaixo.]

Talvez o problema seja que o que Gaiman e McKean fizeram há 25 anos tinha cheiro e gosto de novidade então. Isso não dá pra negar. Mas graças a iniciativas como essa, o próprio meio evoluiu muito. Ironicamente, a ponto da própria subversão e de discussões filosóficas em histórias de super-heróis virarem regra, tirando muito do impacto de uma primeira leitura de Orquídea Negra no século XXI.

Orquídea Negra Edição Definitiva

Vale mais como documento histórico de um período fértil de experimentação criativa (de conteúdo e forma), por uma editora que já se curvava sob o peso da própria continuidade há quase 3 décadas. E também como protótipo de outro experimento similar, este com resultados perenes: Sandman. Mas esta é outra história, que fica para outra ocasião.

 

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